Habilitação Sucessão
Sumário
A expressão "sucessor" apontada no artigo 371 do Código Civil para a habilitação de herdeiros abrange quem justifique que é ele que substitui (legitimidade substantiva) o "de cujus" na relação substantiva que é objecto do pleito.
Texto da decisão
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I -
Tendo falecido a R. Guilhermina........... da acção movida por M............. veio esta sociedade requerer a habilitação dos irmãos da falecida, como seus únicos herdeiros.
Contestaram dois dos requeridos sustentando, na parte que agora interessa, que não são sucessores da falecida porquanto não houve, por parte deles, aceitação da herança.
Foi proferida decisão em considerou estes - MARIA ........... e MANUEL ........... e, bem assim, ANTÓNIO ............ - habilitados para, no lugar daquela Guilhermina, prosseguirem os ulteriores termos do processo.
II -
Agrava a Maria ..........., concluindo as alegações do seguinte modo:
1 - O chamamento dos Requeridos, nos termos dos art°s 2032° e 2133° do Código Civil, à sucessão da sua irmã Guilhermina ......... não significa que, por isso, lhes advenha a qualidade de seus sucessores;
2 - Para tal (para adquirir a qualidade de sucessores, por via legal, da falecida) é necessário que os chamados à sucessão (art° 2032° do C.C.) aceitem esse chamamento - cfr. art° 2050° do Código Civil;
3 - Assim, o nosso Código Civil, prevê que "a aquisição sucessória só se dá após a aceitação e por força dela" - cfr. Francisco Pereira Coelho, Direito das Sucessões, Coimbra, 1992, pág. 155 e J. A. Lopes Cardoso, "Partilhas Judiciais", vol. I, Coimbra, 4. Edição, pág. 16;
4 - Não tendo os Requeridos aceite (expressamente ou tacitamente) a herança, nem isso estando demonstrado nos autos, não pode, assim, atribuir-se-lhes, sem mais, a qualidade de sucessores da falecida;
5 - Não pode, como faz o Senhor Juiz "a quo", retirar-se que a falta de repúdio da herança, através de um acto formal, implica a sua aceitação;
6 - Não tendo os Requeridos, chamados à sucessão, aceite nem repudiado a herança, nem havendo, a pedido do Ministério Público ou de qualquer interessado, sido notificados para, nos termos do artº 2049° do Código Civil, declararem se aceitam ou repudiam o chamamento sucessório, não pode o Senhor Juiz "a quo" julga-los sucessores habilitados da falecida - cfr. art°s 2050° e 2049° - uma vez que estes, não havendo manifestado, expressa ou tacitamente, ter aceite a herança, não podem ser considerados sucessores da sua irmã Guilhermina............
7 - O despacho ora recorrido violou o disposto nos artºs 371° a 374° do Código de Processo Civil e os artºs 2024°, 2032°, 2046°, 2049°, 2050° e 2056° do Código Civil.
Contra-alegou a parte contrária, pugnando pela manutenção do decidido.
III -
A questão a decidir cifra-se em saber se devem ou não ser considerados, "sucessores" duma parte falecida na pendência dum processo, aqueles que, chamados a suceder a tal pessoa, ainda não aceitaram nem repudiaram a herança.
IV-
A construção da recorrente assenta no seguinte raciocínio:
"Sucessor" é aquele que sucede.
Da definição do artº 2024° do CC retira-se, sem margem para dúvidas, que a sucessão é um acto complexo, incluindo o chamamento e a devolução dos bens. Até ter lugar esta última, o chamado tem apenas o direito de aceitar ou repudiar a herança.
Logo, nesta situação, o chamado não pode considerar-se sucessor por ainda não haver aceitação.
V -
Com a decisão recorrida poder-se-á sustentar outra construção:
De acordo com ela a referência a sucessores feita pelo artigo 371°, n.º1 do Código de Processo Civil, encerra em si apenas a ideia de chamamento, sendo desnecessária a aceitação.
Vão buscar essa posição ao artº 375° que se refere à habilitação no caso de incerteza das pessoas, porquanto tal incerteza é incompatível com qualquer aceitação, mesmo tácita, da herança.
Depois, dir-se-á, o mesmo código emprega a palavra "sucessores" com referência até àqueles que repudiaram a herança - n.º1 do art° 1132°.
Compreender-se-á bem, aliás, esse sentido e alcance dado à palavra, “sucessores” daquele artigo 371º: O que se pretenderá não é tomar posição sobre a verificação ou não de toda a dimensão do fenómeno sucessório, mas assegurar, tanto quanto possível, que não fique um vazio processual, com o consequente desaproveitamento do processo.
Esse assegurar aponta para a habilitação dos sucessores do falecido, reconhecidos pelas regras do chamamento. Se acaso, relativamente a algum ou alguns, ao chamamento não se suceder a devolução dos bens, porque se interpôs o repúdio da herança, então e só então, serão afastados da habilitação.
É esta a posição do prof. Castro Mendes quando faz a seguinte pergunta: "Quid juris se, depois de habilitados certos sucessores, estes (todos ou alguns) repudiarem a herança?"- Direito Processual Civil, Lições Policopiadas de 1971-72, II V 0l.217.
Bem se sabe que falecido o réu, pessoa individual, no decurso da acção, tem lugar o incidente de «habilitação dos sucessores da parte falecida.........para com eles prosseguir os termos da demanda»-artº 371º CPC.
A solução da nossa questão passa por determinar o que se deve entender por «sucessor» .
Sobre o que se pretende com a habilitação, vem sendo entendido, pensamos que sem grandes discrepâncias, que com ela se visa colocar no lugar do falecido os habilitados que sucedam, segundo o direito substantivo, na relação jurídica em litígio, tratando-se, por isso, do sucessor no direito em litígio; procura-se, assim, averiguar quem são os sucessores do falecido relativamente ao direito ou obrigação que constituem objecto da acção (Ver por todos, os manuais sobre Incidentes da Instância, CJ 10/3/79, 22/2/81 e BMJ 449/201)
Sobre este tema diz-nos L. de Freitas no seu CPC Anot. 1/631 e segs que a sua finalidade é promover a substituição da parte primitiva pelo sucessor na situação jurídica litigiosa, ocorrendo uma modificação subjectiva da instância (artº 270°-a) CPC) mediante a legitimação sucessiva do sucessor, enquanto tal, para a causa.
Acrescenta que em comum com a habilitação feita na petição inicial (o titular da relação faleceu antes da propositura da acção) é o terem ambas a circunscrição da sua eficácia ao processo em que são deduzidas, visto respeitarem à determinação, originária ou subsequente, da parte processual.
Bem diferente desta determinação de parte processual, salienta o mesmo Prof., ocorre quando a acção tem por objecto a atribuição da qualidade de herdeiro, com o que parece significar que no incidente de habilitação não se cuida de apurar quem é herdeiro mas sim quem será o substituto processual da parte falecida.
Segundo Lopes Cardoso no seu Manual dos Incidentes da Instância, a pág. 288 e segs, com a habilitação o vocábulo «sucessão» utilizado no art° 270º-a) CPC tem um significado amplo, não coincidente com o que lhe atribuem as disposições dos Títulos 2°, livro 3°, parte 1ª CC e chama a atenção de que o artº 373° prevê explicitamente que a qualidade que «legitimar habilitando para substituir a parte falecida» seja diversa da qualidade de «herdeiro».
Logo a seguir, a pág. 289 esclarece que na substituição processual se trata de determinar quem tem qualidade que o legitime para substituir a parte falecida, quem tem as condições legalmente exigidas para a substituição, e daí que a sua legitimidade (do sucessor) deva ser aferida como substituto da parte falecida.
Por seu lado o Prof. J. de Castro Mendes in Drtº Proc. Civil, ed. 1980-2/234 ensina que se chama habilitação á prova da aquisição por sucessão ou transmissão, da titularidade dum direito ou complexo de direitos, ou doutra situação jurídica ou complexo de situações jurídicas (neste mesmo sentido pode ver-se Salvador da Costa no seu «Os Incidentes da Instância»-ed. 1999 a pág. 207).
Acrescenta, a pág. 236 que na habilitação incidente importa a prova de que o transmissário se substitui ao transmitente também na titularidade da relação jurídica processual no processo que tem essa situação jurídica por objecto.
Na tentativa de sermos o mais completos possíveis no que se vem entendendo como fim da habilitação vamos ainda socorrer-nos dos ensinamentos de Salvador da Costa in «Os Incidentes da Instância» e salientar que ele, a pág. 209, defende que na causa de pedir se deverão incluir factos susceptíveis de revelar que os requeridos são os únicos sucessores da parte falecida e, se for caso disso, que aceitaram a herança e que estão na posse dela; não basta, acrescenta, que seja herdeiro da parte falecida sendo indispensável demonstrar que, segundo o direito substantivo, lhe sucedeu na relação jurídica em litígio.
Do exposto afigura-se-nos legitimo concluir que é ao direito substantivo que devemos ir buscar a solução para se apurar quem substitui o de cujus na relação substantiva que integra o objecto do processo, sendo por isso, como bem ensina Salvador da Costa, no local citado, uma questão de legitimidade substantiva que está em causa para se ingressar na posição da parte falecida.
E pensamos que esta opinião sai reforçada quando procuramos apurar o que está em causa na modificação subjectiva da instância.
Na verdade o artº 270° a) CPC-de que o incidente de habilitação é mero executor---diz que se modifica a instância quanto ás pessoas em consequência da «.....substituição de alguma das partes.......por sucessão......na relação substantiva em litígio.
Não se refere, note-se, a herdeiro, sucessível, sucessor nem a qualquer outra expressão do género que inculque a ideia de limitação ao fenómeno sucessório de pessoas, mas antes se socorre dum expressão muito mais lata que abranja quem SUBSTITUA O FALECIDO NA RELAÇÃO SUBSTANTIVA EM LITÍGIO.
Pensamos que esta disposição legal vem reforçar o que já dissemos no sentido de que o que verdadeiramente interessa é a SUBSTITUIÇÃO imposta pela morte de uma das partes (é o que nos interessa) na relação substantiva em litígio.
Segundo o Ac-STJ in BMJ 446/284 (socorrendo-se de alguns dos ensinamentos por nós já citados) o termo «sucessão» utilizado no artº 270° CPC deve ser entendido num sentido amplo, mais amplo que o de sucessão propriamente dita, e por isto que abrange a transmissão mortis causa mesmo que esta transmissão não deriva da sucessão.
O objecto do incidente será, então, como já dissemos, determinar quem tem qualidade que o legitime para substituir a parte falecida na acção litigiosa.
Conforme salienta o Ac-STJ acima referido, pensamos ajudar a esta interpretação o disposto no artº 373° CPC quando prevê explicitamente que a qualidade que legitimar o habilitando para substituir a parte falecida seja diversa da qualidade de herdeiro do que resulta que o objecto do incidente de habilitação é determinar quem teve qualidade que o legitime para substituir a parte falecida, é averiguar se o habilitando tem as condições legalmente exigidas para a substituição da parte falecida.
Portanto o disposto no artº 371º CPC deve ser interpretado no conjunto das disposições legais destinadas a regular quem substitui a parte falecida, isto é, em sintonia com o disposição genérica do artº 270° n° 1 e as mais específicas contidas nos artº 373° e segs C PC.
Tudo isto, claro, em vista a apurar quem substitui a parte falecida na relação substantiva que constitui o objecto do processo.
Quem é, então, este substituto?
E comecemos por apreciar essa questão á luz das leis sucessórias do C. Civil.
Não se ignora que a sucessão está toda ela voltada para a sucessão de pessoas físicas no que respeita à sucessão legal, digamos assim, (artº 2033° CC) estando reservada para as pessoas colectivas e sociedades a possibilidade na sucessão testamentária e contratual, conforme resulta do n° 2 esta última disposição legal.
Como a personalidade jurídica determina a judiciária (artº 5° C PC) bem se compreende que na generalidade dos casos não surja qualquer problema quanto ao sucessor.
Mas, note-se bem, temos de ter presente o período que decorre desde a abertura da sucessão com a subsequente vocação sucessória até à aceitação e que constitui a herança jacente.
Nesse período de tempo, até à aceitação, ainda não há, no rigor dos termos, verdadeiramente «sucessores» mas sim «sucessíveis».
Embora reconheçamos que algumas vezes não terá havido grande rigor na aplicação dos termos (ver artº 1132° CPC onde se aponta para o sucessor que repudiou a herança) a verdade é que o Código Civil, onde de modo exaustivo se tratam esses assuntos, parece ter tido a preocupação em apontar para uma clara diferença entre «sucessor» e «sucessível», o que aliás bem se compreende ser tivermos em conta que só com a aceitação se adquire a domínio e posse dos bens (artº 2050° CC) e que até essa altura a herança é tida como jacente (artº 2046° CC).
Logo no artº 2032° ao regular o chamamento refere os «primeiros sucessíveis» e depois já dentro do Capítulo da herança jacente, abordando a questão da sua administração, atribui certo poderes ao «sucessível chamado à herança, se ainda a não tiver aceitado nem repudiado».
Mas, a nosso ver com decisiva importância, é nos Capítulos da «Aceitação da Herança» e do «Repúdio da Herança» que surge com clareza a designação de «sucessível».
Aí logo no artº 2051º prevê a possibilidade de serem vários os «sucessíveis» e a possibilidade de só alguns deles aceitarem ou repudiarem a herança e logo a seguir, artº 2062°, aponta para o «...sucessível que a repudia».
Também Rabindranath nas suas Lições já citadas, 2/8 refere «....o sucessível ou qualquer um dos sucessíveis chamados à herança sem ter/em exercido ainda o seu direito de a aceitar ou não».
De todo o exposto flui que o legislador Civil foi bem criterioso em definir a herança jacente e em considerar como «sucessível» o chamado que ainda não tenha aceite a herança.
Estamos convictos que o legislador processual não ignorava, assim, a diferença entre «sucessor» e «sucessível» sobretudo em assunto tão melindroso como o de habilitação de parte falecida e daí que defendamos que quando empregou a expressão «sucessor» no artº 371º C PC o fez para significar o sucessível que tendo aceite a herança passou a ter o domínio e posse dos seus bens, sendo a partir de então considerado como verdadeiro «sucessor».
E bem se compreende que assim seja, pois é este «sucessor», posição adquirida com a aceitação herança, que em verdade sucede ao réu na relação jurídica litigiosa.
Até essa altura, da aceitação, não há ainda «sucessor» mas apenas «sucessível» perante uma herança jacente.
Mas tudo isto é assim APENAS enquanto virmos a questão à luz do fenómeno sucessório---portanto, dentro deste e para efeitos de habilitação o legislador ao referir-se a «sucessor» apenas quis abarcar o sucessível que tenha aceite a herança e com tal tenha substituído o de cujus na relação substantiva objecto do pleito.
E põe-se, então a questão de apurar quem deve ser o «sucessor» na posição do réu durante o período da herança jacente.
Bem se sabe que a herança jacente não é um «sucessor» nem um «sucessível» e daí que tenhamos de apurar o que se passa com ela.
A sucessão é o chamamento de uma ou mais pessoas à titularidade das relações jurídicas patrimoniais de uma pessoa falecida e a consequente devolução dos bens que a este pertenciam (artº 2024° CC) que significa que a sucessão só se completa com a devolução dos bens a pessoas jurídicas, com personalidade jurídica, portanto, o que, no que ás pessoas singulares respeita, se adquire no momento do nascimento e com vida (artº 66° CC), sendo certo que para a sucessão têm capacidade sucessória as pessoas nascidas ou concebidas ao tempo da abertura da herança (artº 2033°).
Sabe-se bem que a herança se considera jacente até que seja aceite ou declarada vaga para o Estado (art° 2046°).
Como bem nos ensina M. T. de Sousa in «As Partes, O Objecto e a Prova na Acção Declarativa» a pág. 17 a herança jacente é, assim, a herança cujos titulares ainda não estão determinados, seja porque são desconhecidos quaisquer sucessíveis, seja porque são conhecidos sucessíveis que ainda não aceitaram a herança.
Seguindo muito de perto António S. Abrantes Geraldes in «Personalidade Judiciária» a pág 6 e segs, ed. Centro de Estudos Judiciários, diremos que enquanto permanece sem aceitação (ou declaração de vacatura a favor do Estado, circunstância a que deixaremos de fazer referência por não interessar ao nosso caso) a herança assume PROVISORIAMENTE O LUGAR DO DE CUJUS E CONSIDERA-SE TITULAR DOS DIREITOS E OBRIGAÇÕES QUE A COMPÕEM, citando a favor da sua orientação Manuel Rodrigues in ROA-2-pág 254 e segs.
Passando a analisar o disposto no artº 6° CPC que atribui personalidade judiciária á herança jacente, continua A Geraldes, referindo que esta personificação cessa com o preciso momento da aceitação da herança por parte dos sucessores, pois a lei processual só atribui personalidade judiciária a tal herança jacente (expressão de conteúdo idêntico a «herança cujo titular não esteja determinado» da anterior redacção) e enquanto tal.
Determinados os sucessores e aceite por eles a herança cessa a personalidade judiciária atribuída à herança jacente.
Assim, esclarece no seguimento natural de tais pontos de vista, independentemente da posição processual da herança jacente (autora ou ré) as acções devem ser movidas por ou contra si embora a representação judiciária tenha de ser assegurada por pessoa singular.
No sentido do exposto podemos ver Armando Rodrigues no local citado (ROA n° 11- 253 e segs) frisando que o que interessa para a herança jacente é que se trate duma herança, dum património, cujo titular morreu e que ainda não está encabeçado em nenhuma pessoa jurídica, portanto, acrescentamos nós, em relação à qual ainda não ocorreu a aceitação.
Para ele herança jacente é também a que ainda não foi aceite, chamando à atenção que entre a morte do de cujus e a aceitação pode mediar um grande espaço de tempo, havendo, pois, sempre, mesmo quando os sucessíveis são conhecidos a possibilidade de tal solução de continuidade.
E durante esse tempo, prossegue o mesmo autor, o que se passa é que realmente não existe determinação do titular da herança, ou porque se sabe que existe MAS NÃO SE SABE SE ACEITA A HERANÇA ou porque se desconhece se virá a existir.
Assim, resume, estamos perante uma herança jacente quando apesar de serem conhecidos os herdeiros estes ainda a não aceitaram.
Para A. Varela e outros no seu manual de Proc. Civil, a pág. 11 no casos de herança
jacente é ela «....A VERDADEIRA PARTE NA ACÇÃO E NÃO O SUCESSÍVEL CHAMADO....»
De tudo quanto expusemos afigura-se-nos de concluir:
---aberta a herança por óbito do réu (para nos centrarmos no nosso caso) e feita a vocação sucessória pela sucessão legítima (chamamento dos herdeiros à titularidade das relações jurídicas do de cujus—artº 2032° CC) tal fase culmina (segundo Rabidranath C. De Sousa in Lições de Direito das Sucessões) com a atribuição ao chamado do direito de aceitar ou não a sucessão, sendo certo que este pode ser expressa ou tácita (artº 2056° CC).
Para terminar o processo da sucessão importa referir que de acordo com o artº 2050° CC o domínio e posse dos bens da herança só se adquirem pela aceitação e independentemente da sua apreensão material.
Concluindo todo este raciocínio, e fazendo apelo ao afirmado no Ac-STJ in BMJ 472/443, diremos que antes da aceitação e sem ela não há sucessão, pelo que só após a aceitação e por força dela é que o chamado ingressa na titularidade dos bens ou direitos hereditários.
Portanto, entre a abertura da herança e a aceitação verifica-se a existência do que a lei chama de herança jacente.
Virando-nos outra vez para a habilitação, e na procura do tratamento adequando ao caso de herança jacente, temos, para além do artº 371º, o artº 375° CPC que regula os casos de habilitação por incerteza de pessoas.
O DL 329-Al95 de 12/12 introduziu-lhe um n° 4 que veio estipular que «Nos casos em que à herança é atribuída personalidade judiciária, é licito requerer a respectiva habilitação».
Procurando conjugar este n° 4 com o artº 6° CPC (que atribui à herança jacente personalidade judiciária) diz-nos Salvador da Costa no seu «Os Incidentes da Instância» a pág. 238 que a herança jacente quando o respectivo titular não estiver determinado tem personalidade judiciária e assim, em vez de se requerer a habilitação dos sucessores incertos pode requerer-se a habilitação da própria herança.
Já na anterior redacção do artº 375° CPC, que não tinha o citado n° 4, O Prof. J. C. Mendes in Drtº Por. Civil, pretendendo conjugá-lo com o artº 6° CPC, ensinava que a indeterminação do titular (note-se que nessa altura o art° 6° referia-se à herança cujo titular ainda não estivesse determinado enquanto no actual encontramos a referência á herança jacente-sendo certo que, como dissemos já, as duas versões têm o mesmo significado) podia resultar da circunstância da ocorrer indeterminação de sucessíveis ou de indeterminação de sucessores sendo que para tal Prof. este último caso ocorria quando o sucessível (eventualmente único) ainda não tivesse aceitado a herança, pois enquanto não a aceitar não se sabe se será sucessor.
Daí que, para ele, tanto num caso como noutro havia herança jacente e de igual modo o seu titular não é determinado.
E depois de salientar que a prática não se tem servido destas noções para a herança accionar ou ser accionada conclui que «MORTA A PARTE NO DECORRER DO PROCESSO PODE HABILITAR-SE A HERANÇA PARA CONTINUAR A ACÇÃO COM ELA».
Por seu lado, o Prof. Anselmo de Castro nas suas lições de Proc. Civil, a pág. 546 e segs, chama a atenção de que o artº 375° (ainda não havia o actual n° 4) fazia referência aos interessados incertos mas sem a fazer ao artº 6°, afigurando-se-lhe, contudo, que nada impede que se faça uso do disposto nesta última disposição legal sempre que não ocorra aceitação da herança.
É este mesmo Prof., agora a pág. 631 quando aborda directamente a problemática da habilitação, que aponta para o que a seu ver constitui uma incongruência da lei na medida em que «a herança cujos titulares são incertos (artº 375° n° 1, na redacção sem o actual. n° 4) é uma herança cujo titular ainda não está determinado. Ora, prossegue ele, a herança cujo titular ainda não está determinado goza de personalidade judiciária (artº 6° que hoje aponta para a herança jacente mas que para a questão em estudo é idêntica à herança em que o titular ainda não está determinado) e como património autónomo deve ser representada em juízo pelos administradores....» não devendo assim te lugar a citação de incertos. (voltaremos a esta incongruência).
Dá, assim, a entender que nos casos de herança sem titular determinado (hoje dita jacente) seria já nessa altura (da redacção sem o actual n° 4) ela a que seria habilitada embora representada pelo seu administrador.
Da mesma opinião é Ary E. da Costa e outros no seu CPC Anot. e Coment.-artº 6º, seguindo os ensinamentos deste Professor.
Temos, por fim, J. Lebre de Freitas no seu CPC Anot—artº 375° mas já com a redacção actual e com o seu n° 4----que na nota 3 (1/643) começa logo por salientar que «SENDO ATRIBUÍDA Á HERANÇA JACENTE PERSONALIDADE JUDICIÁRIA (ARTº 6°) É TAMBÉM ADMITIDA A RESPECTIVA HABILITAÇÃO COMO SUCESSORA, ATÉ QUE OCORRA A ACEITAÇÃO DA HERANÇA POR HERDEIROS DETERMINADOS» prossegue fazendo notar a incongruência do regime anterior ao atribuir personalidade judiciária á herança com titular indeterminado e não fazer qualquer referência a tal no artº 375° (que, então, não continha o actual n° 4).
Porém, esclarece depois, que essa «....incongruência só existia para os casos em que a herança não tivesse sido efectivamente objecto de aceitação não naqueles em que, não se sabendo se teria sido, apenas houvesse desconhecimento dos herdeiros da parte---ambas as situações cabendo na previsão do artº 375°.».
A incongruência residiria, assim, se bem percebemos, na circunstância de o artº 375° tanto abranger a herança em que sejam desconhecidos os herdeiros/sucessíveis como aquela em a que a herança ainda não tivesse sido efectivamente objecto de aceitação, o que, com esta referência, apenas se pode compreender como dizendo respeito ao caso de herdeiros/sucessíveis conhecidos mas que ainda não tinham, aceitado a herança. Então, abarcando esta disposição legal as duas situações não se compreendia que nela se mandasse cumprir sempre a citação dos incertos quando para o caso de herança sem aceitação havia a disposição do artº 6º que impunha a habilitação dela representada, então, pelo administrador (artº 22° CPC).
E termina aquele Prof. afirmando, agora com referência á redacção actual do artº 375° n° 4, que «......HOJE É INDUBITÁVEL QUE NOS CASOS DE HERANÇA JACENTE.........PODERÁ REQUERER-SE A HABILITAÇÃO DA HERANÇA, A QUAL, MEDIANTE NOVA HABILITAÇÃO, MAS SEM NECESSIDADE DE NOVA SUSPENSÃO DO PROCESSO, SERÁ SUBSTITUÍDA PELOS HERDEIROS APÓS A ACEITAÇÃO».
Na busca de explicação para a introdução do actual n° 4 diremos que esta asserção final, depois de apontar o que era tido na redacção anterior como incongruência pode e deve ser vista com o sentido de que agora, com ela, continuando a caber nos «incertos» as duas hipóteses acima apontadas, quis-se fazer expressa referência a que agora a incerteza de pessoas, vista como incerteza de sucessíveis pode socorrer-se da habilitação da herança, assim ficando em igualdade de tratamento face á herança jacente (onde também há incerteza de sucessores por falta de aceitação) pois esta só por força do artº 6° já tinha legitimação para a habilitação.
A nosso ver, na esteira dos ensinamentos atrás expostos, a questão da habilitação da herança jacente resultava clara do disposto no artº 6° pois sendo ela que tinha capacidade judiciária nada justificaria que não fosse ela a habilitada quando os respectivos pressupostos estivessem verificados.
O legislador ao aperceber-se da incongruência atrás apontada decidiu clarificar a situação e estipular que a já referida capacidade judiciária também existia nos casos em que, apesar de incertos os sucessíveis, se verificassem os pressupostos da herança jacente.
Introduziu o n° 4, depois de regular em pormenor a citação edital, estabelecendo uma norma genérica de modo a que nela coubessem todos os casos de herança jacente por incerteza dos herdeiros.
A nosso ver, com tal redacção pretendeu englobar nos «sucessores incertos» todos os casos que vimos referindo:
--incerteza por se ignorar quem são os sucessíveis;
--incerteza por, conhecendo-os, ainda não terem aceite a herança, pois também neste caso se não sabe quem vêm a ser os sucessores.
Ao fim e ao cabo o n° 4 pretendeu estender o regime da herança jacente ao caso em que se não conhecessem os sucessíveis mas se soubesse que não tinha havido aceitação e com tal, ficaram claras, ou pelo menos mais claras, as possibilidades em que a herança jacente poderá ser habilitada.
Pelo menos, com a sua introdução, afastou-se a incongruência que alguns autores vinham notando no anterior regime: a herança jacente tinha personalidade judiciária por força do artº 6° CPC e apesar de tal nada era dito sobre a possibilidade de a habilitar.
Reconhecemos que não terá sido muito feliz a introdução do preceito no artº 375° CPC mas tudo fica mais claro se atentarmos ao que se entende por «incertos»; o legislador bem conhecia tal significado, sabia da incongruência que era apontado aos textos legais citados, e limitou-se a fazer a introdução do n° 4 em relação ao todo o tipo de «incertos».
De todo o modo, afigura-se-nos não ter a menor justificação que se admita a habilitação da herança jacente quando os sucessores sejam incertos, no sentido de se ignoraram as pessoas sucessíveis, e não já a admitir nos casos em que a lei lhe atribui toda a razão de ser-no período que medeia entre a abertura da herança e a aceitação---só porque aí os sucessíveis estão concretamente individualizados mas sem aceitação da herança.
A herança jacente, verificados os seus pressupostos, tanto se verifica no caso de serem conhecidos os sucessíveis como quando eles são ignorados e assim não descortinamos razões fortes para tratamento tão desigual relativamente à herança.
Depois, também não vemos razão para que, na hipótese de a parte ter falecido antes da propositura da acção, e em que na petição, caso não haja aceitação, se demanda logo a herança jacente (caso de habilitação legitimidade, como se lhe chama), e quanto o óbito ocorra na pendência da causa já se não admita a habilitação.
Concluímos, assim, que nada obsta a que a herança jacente seja habilitada.
pensamos poder concluir com o que entendemos como deve ser vista a expressão «sucessor» do apontado artº 371º CPC.
Sendo assim, afigura-se-nos que a expressão «sucessor» está claramente dirigida a abarcar no seu âmbito quem, cabendo dentro do conceito de «sucessor» nos termos por nós precisados e/ou cabendo dentro da legitimação de que nos fala o artº 373° CPC, justifique que é ele quem substitui (legitimidade substantiva) o de cujus na relação substantiva que é objecto do pleito.
Isto é, voltando-nos directamente para o nosso caso concreto, a expressão «sucessor» destina-se a abarcar as pessoas e/ou quem esteja legitimado para a substituição que agora apontamos:
----abrange, assim, claramente, o herdeiro que já tenha aceite a herança pois aqui não há a menor dúvida que é ele quem substitui/sucede ao de cujus na relação substantiva litigiosa;
----contudo, vai mais longe e nos casos em que não tenha havido aceitação e ocorra a situação de herança jacente, abarca quem substitua o falecido naquele relação substantiva desde que se encontre legitimada para o substituir, o que, no nosso caso, significa que admite a substituição da parte falecida pela herança jacente.
Esta, como dissemos já, não é sucessor nem sucessível, mas é um património autónomo ou universalidade, detentor de personalidade judiciária e que substitui a parte falecida enquanto não ocorra aceitação da herança.
Assim, quando tal situação se verificar, é ela que deve ser habilitada.
O mais que dali se pode extrair é que se decidiu uma habilitação sem que em concreto tenha havido aceitação (terá sido questão que se pressupôs como verificada talvez por o problema não ter sido levantado) pois se ela tivesse ocorrido já não se colocaria a possibilidade de posterior repúdio uma vez que aquela é irrevogável, como resulta do artº 2061º.
Aliás o mesmo Prof. na obra citada, mas a pág. 20, parece apontar--- ainda numa altura em que o artº 375° CPC não tinha o actual n° 4----para a necessidade de determinação de se saber se houve aceitação ou repúdio quando haja um sucessível determinado e acrescenta que pode haver situações em que se impõe a habilitação da herança.
Agora com a inclusão do referido nº 4 onde de modo claro se veio a admitir a habilitação da herança jacente não faz sentido, como já frisamos, que ela se limite aos casos de incerteza dos sucessíveis e não abranja, sem que nada justifique a omissão, a incerteza por se ignorar se houve ou não aceitação e se a houve por parte de todos ou só de alguns.
De todo o modo salientamos que o próprio Prof. C. Mendes exige, como já referimos, que se apure, nos casos de sucessíveis totalmente identificados, se ocorreu aceitação ou repúdio, o que só pode ter conteúdo útil caso haja diferença de tratamento para um e outro caso.
Para nós o fenómeno da habilitação não deve ser visto como uma simples representação da parte falecida, como parece entender Santos Silveira no seu «Questões Subsequentes em Proc. Civil» a pág. 345 e a decisão recorrida.
Como deixamos dito trata-se antes de apurar quem substitui a parte falecida na relação substantiva em litígio.
Esta tomada de posição conduz-nos, a nosso ver, para a que acima defendemos.
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Os habilitados, irmãos do falecido, sustentam que o A requerente da habilitação não demonstra que tenha havido aceitação.
De tudo o que expusemos atrás resulta o que entendemos ocorrer enquanto não houver aceitação-herança jacente com a necessidade de ser ela a surgir na habilitação em substituição do falecido.
Impõe-se, pois apurar o que se passa com a aceitação que os requeridos dizem não estar demonstrada.
Estamos perante irmãos da parte falecida e assim seus sucessíveis, como resulta do artº 2133° CC. e que em plano de normalidade de aceitação são os naturais sucessores.
Como bem ensina L. Cardoso nas suas Partilhas Judiciais 1/4, na esteira de do ensinamentos do Prof. Galvão Teles na obra aí citada (Direito das Sucessões) e do Ac. STJ in BMJ 249/502 «......não se concede um beneficio a quem o não quer, a lei não impõe aos chamados o benefício, pelo que estes são livres de o querer ou não; MAS COMPETE-LHES TOMAR POSIÇÃO, OPTANDO POR UM DOS TERMOS DA ALTERNATIVA: OU ACEITAM OU REPUDIAM A HERANÇA».
Também C. Mendes, na obra e local já citados-2/20 entende que havendo sucessível determinado a habilitação deve referir-se a ele mas abranger a necessidade de aceitar ou repudiar.
Do exposto afigura-se-nos que a figura da «não aceitação» ou da «ainda não aceitação» se tem de resolver em «aceitação» ou «repúdio» sempre que uma situação processual aponte para esse esclarecimento.
Cabendo ao sucessível o dever de tomar tal posição afigura-se-nos razoável construir a tese de que deve ser sobre ele que recai o ónus de tomar posição face a tal alternativa, não valendo escudar-se perante a ausência de demonstração de que aceitara a herança ou a repudiara.
Na verdade, sendo a normalidade a regra e a anormalidade a excepção, e sabendo-se que em geral os irmãos, como sucessíveis legítimos, aceitam a herança (presunção judicial-artº 351º CC) é sobre estes que recai o ónus de provar a sua não aceitação (artº 342° n° 2 CC) juntando documento de repúdio.
Indicado na habilitação como sucessível cumpre-lhe informar a parte e o Tribunal com clareza e sentido de cooperação (artº 266°-b) CPC) qual a atitude que toma perante a herança.
Pensamos que com o incidente de habilitação de herdeiros (art° 371º CPC) se pode fazer uma aproximação á possibilidade concedida pelo Drtº substantivo (artº 2049° CC) e processual (artº 1467°/1469° CPC) na procura de solução para os casos em que o habilitado se resguarda na posição cómoda de nada esclarecer.
Não esqueçamos que segundo a corrente maioritária a aceitação é um acto jurídico livre unilateral, individual não receptício, ou seja, como bem ensina Rabindranath, na obra já citada-2/ 17 e segs, nota 560, um negócio que não carece de ser dirigido e levado ao conhecimento de pessoa determinada, podendo ser expressa ou tácita.
É sempre um acto pessoal do sucessível e que, por isso, é bem possível ser desconhecido do terceiro que deduz a habilitação e daí que não seja correcto, no mínimo, que aquele não clarifique a sua posição relativamente à herança.
Tratando-se de um acto pessoal do sucessível, pensamos, com um pouco de ousadia, que não podem resguardar-se numa posição de ignorância pois com tal pode-se ter por confessada a aceitação.
São eles, como sucessíveis, que estão em melhores condições que ninguém para tomarem posição esclarecedora perante a alternativa que têm para efeitos da habilitação: ou a aceitação ou o repúdio.
Ora, os citados artºs 2049° CC e 1467° e segs CPC criaram um mecanismo para obrigar o sucessível a tomar posição concreta quanto à aceitação ou repúdio da herança que embora não tenha aplicação directa ao nosso caso (visam a afirmação geral, em direito de acção) podem trazer-nos conforto para a solução que propomos para sair do impasse em que a posição dos requeridos deixa os requerentes e o próprio Tribunal.
Aquelas disposições legais permitem a notificação dos sucessíveis conhecidos que não aceitam nem repudiem a herança para em 15 dias declararem a sua posição concreta e o n° 2 do artº 2049º CC e n° 2 do artº 1467°CPC estabelecem que na falta de declaração de aceitação, ou não sendo apresentado documento de repúdio no prazo fixado tem-se a herança por aceite.
E se é certo que o Incidente de Habilitação não contempla esta possibilidade a verdade é que actualmente o Juiz tem do seu lado, para além do poder de direcção e do princípio do inquisitório (artº 265° CPC) e da cooperação (artº 266°), o princípio da adequação formal (embora para ser utilizado com moderação--BMJ 471/320) que lhe permite determinar a prática dos actos que melhor se ajustem ao fim do processo bem como ás necessárias adaptações, sempre que a tramitação prevista não se adeque ás especificidades da causa, sem esquecermos a possibilidade do convite ás partes para aperfeiçoamento dos articulados, nos termos do artº 508° CPC.
Servindo-nos de tudo quanto expusemos afigura-se-nos que perante a atitude profundamente dúbia dos requeridos no que concerne a aceitação ou não da herança impõe-se o seu esclarecimento em moldes que definam a situação em litígio, e, chamando em auxílio as luzes resultantes do disposto nos artºs 2049° CC e 1467° e segs CC, fazer-lhes a expressa referência de que a não junção da declaração de aceitação nem do documento de repúdio equivale para os efeitos da habilitação, e só para tal, em ter-se a herança por aceite (e dizemos apenas em relação ao incidente para se estabelecer a diferença entre os fins e consequências deste e os da acção especial do artº 1467° CPC).
Nem se argumente em contrário com a circunstância desta notificação estar sujeita a ser requerida pelo Mº Pº ou qualquer interessado não sendo, pois, susceptível de ser oficiosamente desencadeada, (artº 2049° n° 1 CC).
É que, a nosso ver, uma coisa é a acção regulada nas apontadas disposições legais onde se pretende definir uma situação com totais e plenos efeitos a todos os níveis substantivos e processuais (habilitação acção) e outra, bem diferente, é o nosso caso onde apenas se visa solucionar o incidente de habilitação.
Acolá visa-se definir uma situação universal, digamos, enquanto no nosso incidente apenas visamos apurar quem deve substituir a parte falecida para efeitos da relação substantiva em apreciação no litígio processual.
Não estamos perante uma qualquer iniciativa processual por parte do Tribunal até porque, em boa verdade, a iniciativa do incidente de habilitação coube ao autor.
Do que se trata é de, face a um incidente processual, esclarecer a posição do requerido no seu articulado em moldes que a situação surja clara para a decisão a proferir, havendo necessidade de afastar qualquer obscuridade e de ampliar a matéria de facto.
Estes aspectos podem ser conhecidos oficiosamente pelo Tribunal.
Anulada a decisão nada impede que o Sr Juiz aí tome as iniciativas por nós apontadas sem prejuízo de outras que lhe sejam impostas pelo desenrolar do incidente.
F ACE AO EXPOSTO,
ACORDAM EM ANULAR A DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO EM VISTA DA OBSCURIDADE e NECESSIDADE DA SUA SANAÇÃO BEM COMO DE AMPLIAÇÃO QUANTO A ACEITAÇÃO OU NÃO, DEVENDO O Sr JUIZ AGIR EM CONFORMIDADE COM O CAMINHO ACIMA APONTADO.
António José Pires Condesso
João Luís Marques Bernardo (Voto de Vencido:
Votei vencido, no essencial, pelas razões constantes do n.º V do acórdão, que carreara no projecto que elaborei como relator.
Em abono da posição tomada aduzo ainda o argumento retirado da hipótese de não haver herança para aceitar.
Se falecer aquele que nada deixou para herdar e que, por exemplo, é réu numa acção de preferência relativa à venda do seu único bem, como pode prosseguir a lide, se não se habilitarem aqueles que nada têm para aceitar?
Ainda em abono dela, insistimos na invocação do texto do prof. Castro Mendes que se refere naquele n.º V, porquanto, sendo a aceitação irrevogável, só se pode conceber a ideia de repúdio da herança depois da habilitação, se para esta ser decretada, não se tivesse exigido aceitação.
E invocamos opinião fundamentada do dr. Santos Silveira (Questões Incidentais, 344 e seguintes).
Por outro lado e ressalvada sempre a devida consideração, cremos que a solução encontrada não cabe nos invocados artigos 2049° do CC e 1467° do CPC, por, além do mais, não poder o tribunal considerar oficioso o que o não é.
Finalmente cremos poder referir o seguinte:
São aos milhares as habilitações decretadas pelos tribunais sem que se exija a aceitação.
Se a parte queria, na verdade, evitar ser habilitada, tinha aberto o caminho do repúdio da herança.
Não tomando posição, nem sobre a aceitação, nem sobre o repúdio, está a tomar uma atitude dúbia que - ressalvada também a devida consideração - redunda em prejuízo da celeridade e eficiência processuais.
Tendo tal parte, se habilitada, assegurado o direito à exclusão processual repudiando, depois da decisão, a herança, entendemos que o n.º1 do artº 265° do CPC impõe também o caminho da habilitação.)
Gonçalo Xavier Silvano